domingo, 22 de julho de 2007

Uma liberdade assustadora

A verdadeira liberdade pressupõe uma grande responsabilidade: a responsabilidade por tudo o que somos e tudo o que fazemos. No momento em que nos libertamos de todo o tipo de condicionalismos, e assumimos a nossa vida como totalmente nossa, não podemos atirar para ninguém e em situação nenhuma, a responsabilidade do que pensamos, dizemos e fazemos. Mas a verdadeira liberdade gera insegurança, pois afastamo-nos do conforto dos padrões pré-estabelecidos pela sociedade, que nos marcam desde que nascemos. Fomos condicionados e inseridos num grupo, ou grupos humanos padronizados, e de certa forma homogéneos, o que não exige grande esforço ou responsabilidade, bastando-nos seguir o rebanho para ter uma vida satisfatória, ou pelo menos tão satisfatória quanto a maioria. Falo de grupos religiosos, políticos, ideológicos, qualquer sistema de crença ou de pensamento de bases dogmáticas.

Quanto assumimos a nossa liberdade inata, quando nos libertamos das prisões conscientes e consciencializamos da inconscientes impostas pelo mundo onde vivemos, caimos num deserto inicialmente árido, sem bússola nem mapa. Entramos num mundo onde a nossa própria razão e o nosso próprio coração comandam. Agimos conscientemente e livremente, mas num processo que muito exige de nós, pois caminhamos por estradas nunca antes percorridas. Não seguimos a multidão – traçamos o nosso próprio trilho. E daí surge a insegurança, da incerteza de cada passo que damos. Cada passo é novo, e as consequências são por vezes incertas.

Entramos num mundo misterioso e único, pois descobrimos que o caminho pelos outros seguido, que seria sem dúvida a escolha mais fácil para nós, não é o nosso caminho, e que este tem de ser pensado e descoberto por nós constantemente.

Mas o processo de libertação exige grande coragem. Exige uma passagem árdua, do conforto do conhecido, para a insegurança do desconhecido. Mas esse desconhecido será o nosso maior aliado, na medida em que tornará a nossa vida numa aventura de descoberta constante de nós próprios e do nosso caminho a seguir, e permitirá um crescimento muito maior – quanto mais é exigido de nós, mais crescemos. Outra dificuldade de passagem à liberdade tem a ver com a relação sociedade-indivíduo. O amor da sociedade pelos carneiros é conhecido por muitos, e é indissociável do atrito que se gera entre as massas e os indivíduos “diferentes”. O igual, normal, vulgar, é aceite, e o diferente, peculiar, “estranho”, é de certa forma discriminado, rejeitado, ainda que muitas vezes de forma inconsciente. E aí reside a dificuldade de nos afastarmos do rebanho – o medo de rejeição. O medo de sermos discriminados, a preocupação com o que os outros pensam de nós e o medo de sermos olhados como estranhos, impedem-nos de sermos genuínos e livres.

Tomemos por exemplo um prisioneiro, encarcerado durante vários anos numa prisão, onde tem comida e dormida garantidas, sem que nada lhe seja exigido em troca, além do seu bem mais precioso – a sua liberdade. Perde todo o tipo de responsabilidade, passando-a para as mãos da justiça (involuntáriamente, mas não é essa a questão neste momento). Não são raras situações em que prisioneiros são libertados após muitos anos de prisão, quando o comodismo e conformismo eram tão fortes, e o hábito de falta de responsabilidade era tal, que a vontade de sair e voltar a integrar-se na sociedade era muito reduzida, se não mesmo nula. O Homem apega-se às suas prisões, desenvolve por elas uma espécie de carinho distorcido, pois elas assumem grande parte das suas responsabilidades. Falo tanto de prisões no sentido físico da palavra, como no sentido mental, dos condicionalismos. Libertar-se dessas prisões implica um esforço inicial muito grande, mas torna-se imensamente compensatório, proporcionando o máximo de felicidade, realização pessoal e crescimento interior.

Apesar de ser vulgar ouvir o contrário, a maior parte de nós prefere viver num estado inconsciente e preso, mas muito seguro e subjectivamente confortável, do que viver de forma verdadeiramente livre, e assumir a totalidade da responsabilidade da nossa vida.

Para ser um Indivíduo é preciso ter espírito crítico, de forma a identificar as prisões muitas vezes dissimuladas e subliminares, e ser corajoso e enfrentar a insegurança, a incerteza, e o medo de rejeição.

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